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Mulheres muçulmanas e seu lugar na política

  • anacarolineebp
  • 22 de dez. de 2021
  • 3 min de leitura

Um véu que não precisa ser erguido: mulheres islâmicas falam sobre sua representatividade na política Brasileira


A empresária, social media e feminista Paula Souza dos Santos (29) é nordestina, vinda de uma família com fé católica muito arraigada. Atuou em várias frentes de ajuda a pessoas em situação de rua e sempre gostou de causas humanitárias — inclusive, já trabalhou no EJA (Educação de Jovens e Adultos) de sua cidade.

Desde a adolescência, a jovem alimentava uma busca pela espiritualidade, mas sua resposta só veio aos 28 anos, quando se encontrou no Islã. “Era a última religião que eu pensaria em fazer parte, porque, assim como a maioria dos brasileiros, eu tinha uma visão muito deturpada, muito rasa do que é o Islamismo”, afirma.

Logo que optou pelo uso do Hijab (véu tradicional da doutrina islâmica), Paula afirma ter sentido como se, a partir dali, estivesse assumindo uma identidade. Segundo ela, ao se ver em uma posição de minoria tanto de gênero quanto religiosa, percebeu o dever e a vontade de estender o braço e dar um basta. “Aprendi que a gente não pode abaixar a cabeça a vida toda, eu abaixei a cabeça por longos anos e não sabia o poder que o nosso grito tinha. Agora sei.”

Entretanto, Souza conta que, na primeira vez em que saiu às ruas brasileiras usando o Hijab, decidiu ir ao Shopping e sentar para tomar um sorvete. Mas, havia um grupo de jovens ao seu lado rindo e fazendo piadas, e ela era o motivo da diversão. “Obviamente, eu falo a língua que eles falavam. Eu pensei que, claro, eu poderia me levantar e ir falar alguma coisa, poderia sair de lá chorando pelas coisas que escutei, mas eu sei exatamente o que eu estou fazendo, então, ao invés de discutir ou perder meu tempo me estressando, eu preferi ter exatamente o que aquelas pessoas não tiveram, que é empatia e respeito”, ela relata, e continua: "Ja vivi varias situações assim, de comentários, de piadas, de coisas até que as pessoas fazem sem ter o conhecimento de que aquilo vai ferir, tudo por falta de conhecimento, sem pensar que aquilo é islamofobia, por isso, o que mais faço é passar canais, formas e meios de elas adquirirem essa informação, ou até por uma simples conversa, mostrando minha vida, quem eu sou, para tentar ir quebrando um pouco da ignorância dessa pessoa”.

Infelizmente, Paula não é a única a sofrer esse tipo de preconceito. Em novembro do último ano, Rihab Hammadeh, candidata a vereadora em Santo André, foi recepcionada com comentários xenofóbicos ao publicar nas redes sociais seu material de campanha, recebendo mensagens de ódio que a acusavam, principalmente, de ser terrorista, de “sequer ser daqui” e de fazer parte de “uma religião que odeia mulheres”. Assustada, Hammadeh não hesitou em denunciar o cibercrime à Delegacia Seccional de Santo André.

Vale ressaltar que a Lei Nº 9.504, de 30 de Setembro de 1997, prevê que as candidaturas femininas devem ser pelo menos 30% do total de candidatos para algum cargo específico em um partido político. Mas, de acordo com pesquisas feitas pelas organizações Terra de Direitos e Justiça Global, esta proporção de pessoas do sexo feminino em espaços políticos municipais, estaduais ou federais é de apenas 13%.

Apesar disso, a perseverança daquelas que se vêem acima do patriarcado e da falta de laicidade vai além, como afirma a ativista e presidente da organização não-governamental Refúgio Brasil, Faysa Daoud, jordaniana de origens palestinas e naturalizada brasileira há 36 anos.

“Na Jordânia, eu fazia vestidinho de crochê para crianças e doava. Eu cheguei aqui com 17 anos e queria continuar. Meu marido tinha um grande conhecimento e muitas amizades, aproveitei disso, aprendi o português com as empregadas da família e há 20 anos comecei a ajudar pessoas vindas do Egito, África, Haiti, Arábia, Iraque e Síria. “

Daoud ainda conta que o processo de imersão na sociedade brasileira não foi fácil, muito menos quando decidiu atuar como organização sociopolítica. Mesmo tendo crescido com o senso de caridade, os obstáculos culturais, linguísticos, políticos e estatais foram pontos que quase a levaram a desistir, porém, sua fé e consciência de que sempre tem projetos que valem a pena fizeram com que ela seguisse em frente.

Com isso, é importante mencionar, também, que todas as três entrevistadas afirmaram não se sentir representadas ou apoiadas pelo governo atual (desgoverno, como algumas delas mencionaram), tendo de defender seus propósitos em frentes sem apoio das câmaras, reforçando a certeza de que a ameaça feita pelo atual representante de nosso país em 2018, – “Vamos fazer um Brasil para as maiorias. As minorias têm que se curvar.” – não passa de mais uma pedra no caminho que essas mulheres vêm trilhando por conta própria.


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